
UM OLHAR OUTRO
7 de Agosto de 2022
Em
tempos conturbados como os nossos, sabe bem a surpresa de um «simpósio
internacional sobre o sacerdócio», convocado pelo Prefeito da Congregação para
os bispos, Cardeal Marc Ouellet que se interroga: «Não deveríamos ficar em
silêncio, arrepender-nos e procurar as causas de tais delitos (abusos
sexuais)?».
Ainda
bem que o Simpósio se realizou e nos deu uma palavra do Papa, autorizada e
comentada pelos media: «Papa alerta para solidão e inveja na vida dos
sacerdotes. Lugar dos sacerdotes é «no meio das pessoas, numa relação de
proximidade com o povo», diz o Papa”.
É
verdade que, num Simpósio como o que aconteceu, as grandes questões que afectam
a vida dos padres nos tempos de hoje não podiam ser ignoradas. Sem esquecer que
o fundamental da vida e missão do sacerdote está na sua identificação com o
Senhor, importa olhar de frente as diversas causas que, no nosso contexto
cultural, condicionam o exercício do ministério. O Sínodo para o qual o Papa
convocou toda a Igreja tem de resistir a tornar-se refém das «velhas» questões
de uma abordagem superficial: o poder, o clericalismo, os abusos sexuais de
menores, o celibato, a homossexualidade, a ordenação de mulheres. Quem faz a
experiência sinodal acaba por reconhecer quão difícil é resistir a esta
tentação permanente de cairmos nos temas do agrado dos media.
Leio
um comentário de um sacerdote brasileiro sobre o Simpósio: ««A realidade
apresenta um quadro desafiador à vida e missão do sacerdote e que neste caminho
sinodal o Simpósio nos ajuda a ver: Sacerdotes vivendo em situação de abandono;
Sacerdotes sofrendo racismo e preconceito por ser negro; Sacerdotes tratados
como ‘empregados’ e não ‘servidores’; Sacerdotes vivendo a solidão; Bispo sem
paternidade episcopal».
Entretanto,
há uma realidade bem dolorosa que afeta os padres: o suicídio. Não posso ficar
indiferente ao que leio, num escrito do P. Francisco Véneto (Aleteia,
21/02/2022) sobre o que se passa no Brasil, em que «só ao longo de 2021 e
início de 2022, já foram ao menos 10 casos confirmados» e «em novembro de 2016,
por exemplo, uma sequência de três suicídios dentro do período de apenas 15
dias chamou as atenções dos media. Omitindo os nomes: o P.... atirou-se de um
viaduto aos 37 anos de idade. O P.... tinha 34 anos... foi encontrado pendendo
de uma forca. Pouco depois, o terceiro sacerdote... tinha apenas 31 anos».
Claro
que se trata de uma realidade preocupante apesar de não serem conhecidos os
números do que se passa em Portugal, nem entre os padres nem em geral.
Realidade essa que provoca imensas questões, quer à Igreja, aos cristãos e aos
pastores, quer à própria sociedade em geral. Os psicólogos também se
pronunciam.
Um
outro artigo refere-se a «4 casos de padres presos injustamente por abusos
sexuais que não cometeram». Vale a pena parar para pensar:
1.
Diz um bispo: «há membros do clero que tendem a ‘rotular, desprezar, ignorar,
boicotar... e muitos se suicidam porque não encontraram quem se sentasse com
eles para ouvi-los ou os olhasse sem os julgar».
2.
Um sacerdote: «Para muitos, fazer parte do clero é muito mais do que um
problema, um dilema. Homens capazes de pensar e reflectir, mas incapazes de
decidir... tornam-se alguém que vive segundo as decisões dos outros. (...) Não
se podem ignorar as cada vez mais frequentes situações de clamorosa injustiça
decorrente de falsas acusações de assédio sexual ou moral (...) quando a grande
maioria dos sacerdotes não tem culpa nem corresponsabilidade alguma pelos
hediondos crimes perpetrados por uma minoria de bandidos de batina».
3.
Psicólogos: «A vida religiosa não dá superpoderes aos padres. Pelo contrário,
eles são tão falíveis como qualquer um de nós»; «o grau de exigência na Igreja
é muito grande: espera-se que o padre seja, no mínimo modelo de virtude e
santidade. Qualquer deslize, por menor que seja, vira alvo de crítica e
julgamento. Por medo, culpa ou vergonha, muitos preferem matar-se a pedir
ajuda». Para uma psicóloga investigadora sobre o stress, «um dos fatores mais
stressantes ‘é a falta de privacidade. Não interessa se estão tristes, cansados
ou doentes: os padres têm de estar à disposição dos fiéis 24 horas por dia,
sete dias por semana».
E
termino este meu «olhar» sobre a notícia do suicídio de um sacerdote de 77
anos, no passado dia 1 de fevereiro: «entre os bancos da igreja, o cadáver
tinha ao lado um frasco e uma carta na qual declarava sentir-se desprezado pela
própria comunidade».
P.
Abílio Cardoso
Créditos: Foto - Pixabay
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